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terça-feira, 30 de outubro de 2012

MOR!

                                                                                                                                 CONTO
         

          Abriu os olhos. Virou levemente a cabeça e viu sua foto com Paulo: lindos, sorridentes, jovens, corpos esculturais. Esticou o pescoço e baixou os olhos na tentativa de examinar o próprio corpo. Viu a montanha de banha e mais nada. Seu corpo se transformara numa massa amorfa de pão crescido.
          Com dificuldade pegou a escova de cabelos e o espelhinho no criado mudo com a intenção de pentear-se. Mas as mãos trêmulas deixaram a escova cair e o espelho mostrou a ela um rosto disforme, que a chocou. Deus! Quem é esta criatura horrenda? Quem é este monstro? Jogou o espelho com o pouco de força que ainda lhe restava.
         Tentou levantar-se, mas tudo rodou de repente e seu corpo caiu para trás de volta para a cama. Não adiantava mais nada. Não conseguia mais nem ficar em pé. Agora era entregar-se; era a reta final.
         __Bom dia Marisa, meu amor! Está um belo dia hoje! Muito sol! Vai dar  praia! Não quer dar um passeio?Já tomou seus remédios? Sabe que o médico recomendou que não deixasse de tomar, não sabe? Aqui estão! Trouxe seu leitinho desnatado  e seu café com adoçante, meu amor.E também este lindo botão de rosa como prova do meu amor.
Te amo demais, querida! Quero ver você fora desta cama logo. Tome seus remédios. Espere! Vou separá-los já para você! Aqui estão; engula com o leite para não lhe fazer mal!Vou dar uma saída mas logo volto. Se precisar de alguma coisa, é só tocar a campainha  que  a  Zilda vem te atender. Se ela fizer alguma coisa que te aborreça, você me conta. Ok?
      __ Hum, hum! -resmungou Marisa enquanto engolia os remédios.
           E em seguida deveria mergulhar  novamente em sono profundo, como já vinha acontecendo há anos.Só acordaria novamente quando Zilda lhe trouxesse o almoço. Ainda sonada, comeria a refeição escolhida para ela por Paulo, tomaria mais outros remédios que Zilda lhe daria e depois só acordaria para a higiene vespertina,- que Zilda lhe faria na cama-, e para o jantar, ocasião em que Zilda lhe daria mais outro tanto de remédios e outra montanha de comida. Paulo só viria novamente tarde da noite, quando chegaria da rua, com bafo de cerveja e cheiro de mulher, para lhe desejar boa-noite e dar-lhe os últimos comprimidos do dia.
         Mas, naquela manhã, em meio ao seu torpor, ao olhar para o retrato e para o espelho, Marisa resolvera dar um basta em tudo. Depois que Paulo saiu, retirou da boca boa parte dos remédios. E assim foi fazendo ao longo do dia. E ao longo dos dias, daquele dia em diante. Começou a emagrecer. Como ninguém realmente olhava para ela, ninguém notou nada. Sempre que um dos dois entrava no quarto, fingia estar dormindo. E os comprimidos, gradativamente foram indo para dentro de uma caixinha  de músicas, com uma esbelta bailarina em cima. A parte inferior em forma de bauzinho, possuía uma pequena chave, que ela escondia no fundo da gavetinha do criado-mudo . Dias mais tarde, menos dopada, conseguiu se levantar, e caminhar até o vaso sanitário. A comida e os comprimidos passaram a ser  encaminhados gradativamente para lá. Marisa tinha agora um só objetivo. Isso lhe dava forças para se livrar da obesidade e da dependência química. Queria morrer.
        Conforme se livrava do torpor dos remédios, cenas lhe vinham à memória: o namoro pleno de emoção, fantasia, desejo; a dedicação de Paulo em fazê-la feliz, os passeios às escondidas da família, - que não gostava de Paulo - os filhos, o próprio casamento, - praticamente sem ninguém presente devido à desaprovação das famílias -, o casamento dos filhos, a saída dos filhos do país à procura da realização profissional e finalmente a vida do casal solitário. Mais tarde, as aventuras de Paulo com outras mulheres, o desprezo, o abandono, a solidão, a depressão, o desespero, o desânimo, a vontade de morrer. Também, às vezes, a lembrança das tentativas de suicídio anteriores, frustradas.
       Depois, os diagnósticos diferentes de vários psiquiatras todos apressados em entupi-la de remédios: depressão, transtorno bipolar, esquizofrenia, paranoia, etc. Achara estranho.  Mas quem era ela para questionar os médicos que Paulo lhe arranjara com tanto carinho?Obedecera. Entregara-se aos remédios que a alucinaram, alienaram e desmotivaram para a vida. A obesidade se instalara em seu corpo e fizera o trabalho final. Levaram-na a uma prisão domiciliar. Paulo trazia também médiuns, pais- de – santo, curandeiros. Tentara de tudo por ela! E o diagnóstico deles todos: possessão demoníaca, influência de espírito obsessor, etc.
          Mas só Marisa sabia o que realmente sentia: Paulo não a amava e queria matá-la. Queria somente os bens que tirara dela ao longo dos anos. Na verdade, ele a odiava de modo contido. Marisa podia ver isso no seu sorriso dissimulado, na sua solicitude  venenosa,nos seus olhos que sempre desviavam o olhar .  Enganava a todos. Todos o tinham como um homem exemplar, bom marido, bom pai. Os amigos chegavam a aconselhá-lo a parar de sofrer e a abandonar Marisa. Porque não o fazia? Marisa sabia!
        Paulo plantara e agora ansiava pelo momento da colheita. Mas para isso  precisava chamar Madame Morte. Fizera para os dois um seguro milionário onde um era o beneficiário do outro. Assim, ficaria livre de suspeitas; o crime perfeito!Pelos seus cálculos, Marisa morreria logo. Impossível aguentar por muito mais tempo obesa e com superdosagem de remédios tão fortes!E ele, além de herdar parte dos  bens de Marisa , receberia o seguro milionário . Já saboreava, com antecedência, o quanto iria aproveitar a vida, depois de tantos anos de sacrifício. Mas valeria a pena! Já imaginava as mulheres que teria a seus pés, as viagens, as bebedeiras...”Vou-me embora prá passárgada!”- pensava e sorria feliz.
         Aos poucos, o conteúdo de algumas das cápsulas dos comprimidos mais fortes foi deixando de ir para o vaso sanitário. Foi sendo estocado, armazenado e escondido por Marisa. Iria matar Paulo também. Faria com que provasse de seu próprio veneno. E em seguida, aí sim, se mataria.
         Toda noite ele lhe trazia um suco de laranja que Zilda preparava. Naquela noite Marisa decidiu acabar com seu tormento de vez. Iria dar cabo de tudo e descansar em paz! Desta vez não falharia! Seu tormento acabaria. Chamaria Madame Morte enfim. Paulo estava demorando mais do que o costume. Com certeza chegaria muito bêbado. Decidiu. Era a noite ideal. Ele talvez sentiria o amargor no suco, mas acharia que era efeito da bebida no seu fígado e não desconfiaria de nada. Paulo bêbado não pensava.
         Como sempre, chegou alegrão, sorriso estampado no rosto, já curtindo a viuvez. Ah, meu pai!Está chegando a hora da minha libertação!- pensou.  Havia tomado umas cervejas a mais mas não se esquecera dos remédios de sua fofa Marisa. Entrou no quarto com o copo de suco de laranja e encontrou Marisa chorando.
       ___Que foi, minha querida?
      ___Estou com medo, Paulo! Acho que Zilda está apaixonada por você  e anda pondo veneno no meu suco de laranja.
      ___Pelo amor de Deus, Marisa! A Zilda é uma santa!Não fala mal dela não , que é pecado!
     ___Tá bem , Paulo! Mas hoje eu não tomo esse suco. Vai buscar um copo de água para eu tomar  meus remédios.
    ___Tá, Marisa. Eu vou. Não precisa ficar nervosa.
          Paulo saiu do quarto e desceu as escadas para a cozinha resmungando: gorda asquerosa! Qualquer dia perco a paciência e acabo com você de vez! Deus é pai! Não aguento mais essa nojenta!Ah, Jesus! Me livra desse carma!
     Assim que entrou com a água Marisa  disse, enquanto tomava os remédios com a água:
    ___Então me prove que isso é coisa da minha cabeça! Me prove que confia na Zilda! Tome o suco!
    ___Tá bem, querida. Confio plenamente nela! Veja! E tomou o suco todo.
          No último momento, Marisa mudou de ideia. Vendo Paulo morto, ali ao lado da cama, onde tanto fora manipulada, resolveu não se matar. Despejou o conteúdo da caixinha de música no vaso sanitário e deu a descarga! Queria viver! E desta vez, faria a escolha certa! Sem outros Paulos !
           Na tarde seguinte, no funeral de Paulo, todos se admiravam da presença de Marisa, a viúva milionária da praça, sentada numa poltrona, ao lado do caixão.     
          Aparentando estar sob efeito de forte medicação, com a fala arrastada, apoiando-se nos braços da poltrona para não cair, explicava  aos amigos dele,entre um surto e outro de choro: foi um ataque fulminante do coração, uma ironia do destino! Tomei meus remédios e apaguei! Só me dei conta do que havia acontecido hoje cedo, quando acordei. Quem iria imaginar que Paulo tinha problemas de saúde!     Nunca reclamou de nada! Um santinho! Deus sabe a falta que me fará! Não sei como vou aguentar sozinha!
         Alguns homens, amigos de Paulo, comentavam em surdina: estava um pouco gorda, é verdade. Mas formosa!


      

TEXTO DE RITA VELOSA
PROTEGIDO POR DIREITOS AUTORAIS
FAVOR CITAR SEMPRE A AUTORIA 
  

2 comentários:

  1. UMA NARRATIVA REAL, NÃO SEI SE FATO VERÍDICO, MAS DE TOADA A MANEIRAS UMA LEITURA AGRADÁVEL, EMBORA SEJA UMPOUCO TRISTE

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    Respostas
    1. Nada real.É um conto apenas.Mas deve acontecer por aí, com certeza!
      Inspirado em fatos da mídia de nossos dias.

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